Apesar das obras de modernização em andamento na região do Porto de Santos, o maior da América Latina, o cenário nas ruas, em relação aos modelos dos caminhões é de ao menos 20 anos atrás. Nos pátios dos terminais de carga é possível encontrar modelos dos anos 70, indo e vindo no seu ritmo de operação contrastando com um ou outro modelo mais atual que eventualmente surge no local.
"É muito mais fácil ver caminhões antigos circulando na área do Porto do que modelos mais novos", diz o guarda portuário Renato Ribeiro. Há sete anos na função e acostumado ao dia-a-dia da região portuária, ele garante já ter fiscalizado veículos sem as mínimas condições de operação.
O autônomo José Alberto Greco, de São Bernardo do Campo/SP, por exemplo, é dono de um Scania 112 H fabricado em 1983, e tem como prática normal executar pequenos serviços de correção no veículo. No momento em que conversava com a reportagem da Revista O Carreteiro, e contava experiência vividas com seu caminhão, estava empenhado também em apertar parafusos da porta do passageiro, que estavam quase se soltando.
"Minha rotina é essa, a cada viagem é uma emoção diferente. Comprei esse caminhão há 10 anos e tenho de me virar com ele", disse. Admite que a manutenção é muito cara, mesmo tratando-se de um veículo antigo, e por conta disso a conservação do caminhão é sua maior dificuldade na profissão e que não pode ficar parado, pois seu sustento depende exclusivamente do veículo, por isso mesmo precisa trabalhar sem poder ficar parado muito tempo. Apesar de trabalhar somente à luz do dia e não fazer trechos longos, confessa que a cada viagem pede a Deus que o acompanhe e que não deixe seu caminhão quebrar nas estradas. "Todas as vezes que enfrentei problemas estava dentro da cidade. Deus tem escutado meus pedidos", conclui.
Mais antigo que o Scania de Greco é o modelo da mesma marca de propriedade de José Benedito Leme, de Peneiras, Interior de São Paulo. Seu caminhão modelo LK 140, fabricado em 1977, também é o instrumento de sustento dele, sua esposa e dois filhos. Comprado há sete anos de um amigo, Leme roda cerca de 400 quilômetros por dia. Diz que não enfrenta muitos problemas de mecânica, mas garante ser parado constantemente pela polícia rodoviária.
Mesmo garantindo que a documentação do veículo está em dia, diz que os policiais alegam não ser mais permitido fazer transporte com o veículo, por ele ser velho e não corresponder às normas de segurança de trânsito. "Sempre depois de muita conversa eles me liberam e me deixam seguir meu caminho. Eu sempre alego a mesma coisa, ele é o meu sustento e preciso dele para trabalhar".
Existem caminhões com 30 anos de idade que operam nos terminais do porto desde quando eram novos. É o caso de um Scania 111 e um Fiat 190, fabricados em 1981, ambos de propriedade de Dorival Wenzel, um carreteiro que já completou 60 anos de idade. "Hoje são modelos antigos, mas comprei os dois 0km. Ainda lembro o cheiro de novo deles", recorda Wenzel, já costumado a permanecer esperando por mais de nove horas para descarregar. Ele dirige o Scania e um motorista contratado o Fiat 190.
Há 30 anos na profissão, acrescenta que desde a aquisição dos veículos até os dias atuais muitas coisas mudaram. No seu caso para pior, pois não conseguiu trocá-los por outros mais modernos. "Apesar da facilidade na compra de veículos novos hoje em dia, a documentação é cara, o combustível só aumenta, e quando coloco tudo na balança é mais fácil gastar com a manutenção dos meus caminhões", defende. Por conta disso, acredita que irá se aposentar sem trocar seus "Xodós'. "Além disso, a gente acaba se apegando aos nossos companheiros de estradas, pois é muito tempo juntos e temos histórias para uma vida inteira" conclui.
Já o carreteiro Gilberto Oscar Júnior, Belo Horizonte/MG, não vê a hora de trocar seu Scania 111, fabricado em 1976. Conta que guarda dinheiro para investir em um novo modelo, de preferência um 0KM e que está cada dia mais complicado transitar com seu caminhão antigo, mas por enquanto esse é o único jeito. "Enquanto não consigo trocá-lo, preciso trabalhar", conforma-se.
Com problemas mecânicos por ser muito antigo, diz que toda viagem tem sido complicada, pois não consegue rodar mais de 150 km que já começa a enfrentar problemas. "Além disso, a polícia não dá brecha e me para toda hora". Oscar Júnior adquiriu o Scania de seu pai e deu continuidade ao trabalho, pois acredita que ser carreteiro está no sangue, por isso não tem jeito. "Apesar das dificuldades enfrentadas, amo essa profissão e tenho certeza de que quando conseguir comprar meu caminhão novo, surgirão novas oportunidades", finaliza confiante.
FONTE: Revista O Carreteiro