Caminhões costumam ser apontados como os grandes vilões dos problemas de trânsito nas grandes cidades. Mas, especialistas ouvidos pelo G1 garantem que simplesmente proibir a circulação desse tipo de veículo é uma solução de curto prazo que logo se torna ineficiente. A saída seria investir nas chamadas centrais de distribuição de cargas e, claro, em transporte público.
O engenheiro civil Maurício Pina, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), explica que, de fato, os caminhões estragam o pavimento com seu peso e têm menos mobilidade para manobras. Há ainda o risco de acidentes, pois a resposta dos freios em veículos maiores é mais demorada. Por fim, os motoristas às vezes param em locais inadequados para carga e descarga e em horários de pico, o que entope as vias.
“As centrais de carga situadas na periferia impediriam o acesso de carretas pesadas ao núcleo das cidades. Nesses depósitos, as cargas vindas de outras regiões seriam desembarcadas e acomodadas em caminhões pequenos, que pudessem ingressar na área central sem prejuízo ao trânsito, ao pavimento e à segurança das pessoas”, afirmou.
O professor do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) Archimedes Azevedo Raia Junior ressalta que o processo inverso também é válido.
“As mercadorias produzidas nas cidades seriam levadas em veículos menores para os terminais de distribuição. Ali seriam consolidadas e sairiam da área urbana nos grandes caminhões”, disse Raia Junior, que defende uma análise profunda e o planejamento de uma política de mobilidade de cargas. “É preciso ter visão de como a distribuição das mercadorias vai acontecer, senão o governo fica só restringindo, mas não resolve o problema. Até diminui o número de veículos e melhora o trânsito momentaneamente, mas não soluciona a questão da mobilidade de cargas e dos congestionamentos. Não basta proibir.”
Raia Junior garante ainda que o transporte de cargas não é único vilão do trânsito. “O problema é que as restrições são decididas de maneira isolada, apenas com o intuito de diminuir o número de veículos nas ruas. Não só as pessoas têm de circular, mas as cargas também precisam, já que são elas que fazem a economia crescer”, disse.
Já Pina lembra que até o preço dos produtos que chegam ao consumidor podem ser afetados pelo excesso de proibições. “A restrição na circulação obriga o caminhão a ficar imobilizado, o que consequentemente aumenta o valor do frete. Esse custo é repassado para as mercadorias”, disse.
Transporte público
Os especialistas concordam que as restrições aliviam temporariamente o trânsito e ressaltam que, além dos terminais de carga, é importante investir em transporte coletivo eficiente para atrair o usuário.
“A consequência da falta de transporte de passageiros é o mar de automóveis nas ruas das cidades. E sem o planejamento do transporte de cargas, há o trânsito descontrolado de veículos. É necessário pensar no planejamento urbano como um todo, principalmente com ênfase ao transporte coletivo. Caso contrário, o automóvel toma conta e as medidas paliativas são implantadas”, afirma Raia Junior.
Para Pina, se não houver investimento em transporte e as pessoas continuarem a usar carros como uma solução particular, as cidades vão literalmente parar. “Será impraticável circular dentro das cidades. Um apagão no trânsito está próximo de acontecer, porque a quantidade de veículos aumenta cada vez mais, há circulação de caminhões sem o menor controle e não são feitos investimentos no transporte público.”
Pina acredita que, mais do que uma questão de organização urbana e mobilidade, o assunto está diretamente relacionado com a melhoria da qualidade de vida nas grandes cidades.
FONTE: G1 SP