Facchini

Os caminhões em marcha lenta

Uma viagem com o pé no fundo do acelerador, seguida por uma derrapagem que ameaça terminar em capotamento. Esse é o retrato do momento vivido pelo mercado de caminhões no Brasil. Após anos de crescimento de dois dígitos, o segmento de repente se vê diante de um quadro “alarmante”, nas palavras de um executivo que atua na área: queda nas vendas, produção em baixa e montadoras dando férias coletivas aos empregados. “Vivemos hoje uma tempestade perfeita”, define Oswaldo Jardim, diretor de operações da Ford Caminhões. O principal motivo para a mudança de faixa é a introdução de uma nova tecnologia, chamada de Euro 5, que desde o início do ano se tornou obrigatória em todos os caminhões fabricados no Brasil. 


Embora seja menos poluente 
55 motores novos emitem mesma quantidade de gases que um caminhão fabricado nos anos 1980 –, ela também gera um aumento médio de 15% no preço. “A mudança é necessária”, diz o consultor Paulo Petroni, da PWC. “Uma frota mais moderna vai trazer benefícios para todos, até para as empresas e autônomos que usam os veículos.” O grande problema são os custos envolvidos na transição. Além de mais caros, os motores Euro 5 usam como combustível um tipo de diesel chamado S-50, com preço superior ao do diesel comum. Por outro lado, oferecem maior autonomia e seguro mais barato. Já se sabia que a transição para o novo modelo não seria fácil: no fim do ano passado, os clientes anteciparam as compras dos caminhões de modelo antigo, que usava o motor conhecido como Euro 3, para evitar os preços mais altos. 
“Isso naturalmente esvaziou as vendas no início do ano”, diz Alarico Assumpção, presidente-executivo da associação das distribuidoras, a Fenabrave. No acumulado dos quatro primeiros meses do ano, houve queda de 9% em relação ao mesmo período de 2011. Mas o pior pode estar por vir. As vendas nos quatro primeiros meses deste ano eram formadas na maior parte pelo estoque acumulado dos modelos antigos. Com o fim desses estoques, a tendência é de um recuo ainda maior. Em abril, por exemplo, a queda em relação ao ano passado já chegou a 20%. “Os números estão vindo mais severos do que o setor havia imaginado”, admite Antônio Roberto Cortes, presidente da LAN Latin America. Resultado: com a produção registrando baixa de 30%, as montadoras adotam o regime de quatro dias de trabalho por semana e promovem interrupções na fabricação.
Na Ford, a montagem ficou parada durante toda a semana passada. Entre os motivos para esse cenário mais apertado do que era esperado estão os problemas que envolvem a distribuição do diesel S-50. A Agência Nacional de Petróleo (ANP) havia determinado que pelo menos 3,7 mil postos deveriam estar comercializando o combustível. Segundo o monitoramento mantido pelas empresas do setor, no entanto, hoje menos da metade desse número possui o S-50. De um lado, os donos de postos não querem comprar um combustível que pode ser até R$ 0,20 mais caro por litro que o diesel normal, sem ter garantia da demanda. De outro, as empresas têm receio de comprar caminhões Euro 5 e não haver lugar para abastecer. Pior: dos postos que possuem o S-50, quase todos estão concentrados nas capitais. 
“Perdemos várias vendas porque os clientes não tinham nenhum posto com o diesel em um raio de 200 quilômetros”, diz Jardim, da Ford. Uma série de outros fatores se concentrou para gerar ainda mais problemas para os fabricantes. O fraco desempenho da economia mundial está prejudicando as exportações. A seca no Sul do Brasil deixou muitos caminhões ociosos e reduziu o preço do frete, o que esfriou a demanda por veículos novos. E, acima de tudo, há a dificuldade para obter crédito para as compras. “O problema não é tanto a falta de dinheiro para a compra, mas sim a dificuldade para liberar esse crédito”, diz Jardim. “Há muito receio por parte dos bancos por causa do crescimento geral da inadimplência.” 
O quadro só não é pior porque o setor conseguiu que o governo reduzisse os juros do programa de financiamento do BNDES, o Finame, responsável por 85% das compras feitas no país. As taxas caíram de 10% para 7,7% ao ano. “Foi uma injeção de ânimo na veia”, afirma Tânia Silvestri, diretora de vendas e marketing de caminhões da Mercedes-Benz. As empresas seguem em busca de saídas para retomar a velocidade. A Mercedes, por exemplo, aproveitou a transição para renovar toda a linha de produtos. “Empacotamos várias mudanças de uma vez só para coincidir com a chegada do Euro 5”, diz Tânia. A montadora alemã reservou uma frota de mil caminhões para demonstrar as inovações e capacidades dos modelos recém-lançados nas concessionárias.
Na MAN, líder do segmento no Brasil, a intenção é promover uma campanha de esclarecimento junto aos compradores das vantagens da nova tecnologia. “O custo operacional para o cliente é menor”, afirma Cortes. A ideia é que, com consumo até 9% inferior ao do diesel comum, mesmo que custe um pouco mais na bomba, o S-50 acabe sendo um argumento poderoso na conquista de novos clientes. Já a Ford apostou no fortalecimento dos estoques dos caminhões Euro 3 para suavizar a transição. A empresa reforçou o abastecimento das revendas até março e espera que as reservas durem mais tempo, gerando um fluxo de vendas constante, enquanto os clientes se acostumam aos modelos Euro 5. 
FONTE: Istoé Dinheiro 
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