Facchini

Diga não ao excesso de peso

Transportar carga além do limite permitido por lei não é apenas uma questão de assumir riscos e custos de manutenção, é uma questão de falta de ética no trabalho. Além dos prejuízos mecânicos e da falta de responsabilidade, sobrecarregar o veículo implica tomar para si a carga que outro profissional poderia transportar.
Mas este é um assunto complexo. Especialistas buscam mostrar aos transportadores as consequências de tal prática ilegal, porém ainda comum no Brasil.
O presidente da NTC&Logística (Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística), Flávio Benatti, diz que o sobrepeso de veículos causa também impacto direto no preço do frete. “Transportar mais do que o veículo suporta é uma prática que lesa toda a sociedade e gera uma concorrência desleal no setor.” Benatti explica ainda que o transportador que se submete a carregar mais carga do que o permitido em seu veículo aceita valores menores pela operação, já que está com grande volume de carga no caminhão, geralmente o suficiente para pagar os custos da operação. Isso faz com que profissionais que trabalham dentro da legalidade não consigam ter acesso a esse tipo de carga, devido aos preços baixos, que não cobririam seus custos. “Esse é um problema crônico brasileiro”, comenta.
Para o especialista em transporte, muitos profissionais do setor acreditam ter algum tipo de vantagem com a sobrecarga. E esse, de fato, é o problema central da questão, e que leva transportadores à prática do sobrepeso. Benatti esclarece que, a princípio, parece interessante para o transportador realizar uma operação com o caminhão carregado além do seu limite máximo de capacidade. O valor dessa operação pode ser interessante. No entanto, quando calculados os custos da prática é levadas em consideração as péssimas consequências para o trânsito em geral, torna-se nítida a improbidade do excesso de peso para o transporte rodoviário de carga.
Mais do que isso, além da falta de ética e de respeito com o próximo, a sobrecarga é um problema para si próprio. A pior e mais grave consequência dessa ação são os danos causados ao veículo. Claudio Gasparetti, gerente de marketing de caminhões da Mercedes-Benz, diz que “a sobrecarga engana: não há nada vantajoso nessa prática”. Segundo o engenheiro, os danos ao veículo são gigantescos, decorrentes de excesso de peso. Vão desde desgaste dos pneus, maior consumo de combustível, quebra da suspensão a desgaste do sistema de freios, o que compromete seriamente a segurança do caminhão.
O especialista da Mercedes-Benz explica que os caminhões da marca contam com uma margem de segurança em sua CMT (Capacidade Máxima de Tração). Ou seja, os veículos têm capacidade de carga projetada para suportar as adversidades das operações. Quando um caminhão está carregado com sua capacidade máxima (dentro do permitido) e passa em um buraco, por exemplo, o impacto multiplica o peso da carga e o veículo tem de estar preparado para tal circunstância. No entanto, quando essa margem de segurança é ultrapassada, acontece a sobrecarga, o caminhão não vai suportar até mesmo os menores impactos e se tornará vulnerável a eles. “Instruímos os clientes a jamais optar por essa prática. Quando nossos técnicos identificam que determinada peça apresentou problema devido à sobrecarga do veículo, o cliente perde automaticamente a garantia do componente”, diz Gasparetti.
Outra questão negativa de exceder a capacidade de carga do veículo é o aumento da emissão de gases poluentes. Além de o veículo consumir mais combustível, a queima começa a ficar irregular com o tempo, já que o motor trabalha sob pressão, o que piora a qualidade dos gases liberados. Veículos com excesso de peso são os principais responsáveis também por danificar o asfalto nas estradas. “Caminhões com sobrecarga causam uma redução na vida útil do pavimento das rodovias pelo surgimento precoce de trincas, buracos e afundamentos na superfície do pavimento”, comenta Paulo Rosa, assessor de projetos especiais da Ecovias.
Segundo Rosa os gastos com detrimento do pavimento, oriundo de caminhões carregados, podem ser da mesma ordem de grandeza ou até maiores do que os danos provocados por causas naturais.
A solução encontrada pela empresa para evitar abusos foi instalar sete balanças nos pouco mais de 175 km de extensão administrados pela companhia. “A balança é imprescindível para a preservação do pavimento e para a segurança viária, pois evita que os veículos circulem pelas rodovias com cargas acima do peso permitido, reduzindo consideravelmente os riscos de acidentes”, diz Rosa, ao acrescentar que as tolerâncias legais de sobrecarga, que aumentaram de 5% para 7,5%, em 2010, são danosas ao pavimento. Esse é o que, por lei, o transportador pode exceder conforme Resoluções do Contran (Conselho Nacional de Trânsito).
O grande problema são as rodovias não concessionadas. Segundo Benatti, estradas controladas pelo governo não contam com balanças ou qualquer tipo de fiscalização para evitar o sobrepeso. “O poder público demonstra um verdadeiro descaso com esse tipo de irregularidade.” O presidente da NTC afirma estar discutindo com o governo e com autoridades do setor para encontrar formas de evitar a prática da sobrecarga, mas as negociações pouco têm progredido. “Há falta de interesse do poder público”, diz.
Os especialistas do setor de transporte acreditam que um caminhão com 50% de excesso de carga cause 10 vezes mais danos ao asfalto do que se estivessem obedecendo a lei da balança.
A sobrecarga é um problema inegável dentro do transporte rodoviário de cargas e poderia ser solucionado com a conscientização de todos, pois, afinal, se o país luta por um transporte responsável, essa não pode ser uma prática comum.
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