Mais uma vez o Brasil, baterá recorde de safra. Segundo os últimos números da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), divulgados no mês de janeiro, a colheita de grãos chegará a 196,67 milhões de toneladas, novo recorde estabelecido ficando 5,2% acima da temporada passada, que foi de 186,86 milhões de toneladas. No entanto, se os produtores estão fazendo a lição de casa, o lado de fora da porteira, novamente, deve deixar a desejar.
O escoamento da safra já iniciou com o começo da colheita em estados do Centro-Oeste brasileiro. Especialistas e representantes das cadeias produtivas do agronegócio acreditam que as imagens de filas de caminhões nos portos, depois de passarem por estradas sem condições de uso, se repetirão mais uma vez. No ano passado, o clima também não ajudou, com muitos dias chuvosos nas regiões portuárias de Santos (SP) e Paranaguá (PR) e que impediram a regularidade dos embarques dos grãos para outros mercados. Um dos impactos causados foi o cancelamento da compra de mais de dois milhões de toneladas de soja pelos chineses, principal importador da oleaginosa brasileira.
A única novidade para este período, de acordo com o secretário geral da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), Fábio Trigueirinho, é a entrada em operação de um novo porto em Imbitituba, no Estado do Pará, que terá capacidade para escoar quatro milhões de toneladas de soja oriunda do Mato Grosso. “Não temos mais mudanças estruturais. Vamos operar com as mesmas rodovias, ferrovias e hidrovias, e a situação será a mesma neste ano”, salienta.
Trigueirinho reconhece o esforço do governo federal em buscar soluções para melhorar a logística no País através da concessão de modais de transporte. O Programa de Investimentos em Logística, coordenado pela Empresa de Planejamento e Logística (EPL), prevê investimentos de R$ 212,3 bilhões para desenvolver os modais de transporte do Brasil, por meio de concessão de rodovias, ferrovias e hidrovias, mas a cedência de trechos de estradas ainda está na fase de assinaturas de contratos. “Acabamos tendo um dispêndio de frete de quase US$ 150 dólares, um dos mais caros do mundo. O país não está preparado para transportar uma safra desse tamanho”, avalia o dirigente da Abiove.
Para o diretor geral da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (ANEC), Sérgio Mendes, o escoamento da safra nesta temporada não terá os sobressaltos ocorridos no ano passado, quando a chuva paralisou atividades por diversos dias nos principais portos brasileiros. “Além disso, tivemos bons preços no milho e isso fez com que uma grande quantidade do estoque de 2012 fosse embarcada em 2013 justamente no começo da safra de soja”, lembra.
O professor da Universidade Mackenzie de Campinas (SP), Mauro Schlüter, acredita que uma das principais soluções para o problema do escoamento da safra seria o de distribuir o trabalho ao longo do ano e acabar com o pico de demanda. A ideia partiria da criação de polos de transformação dos produtos do agronegócio em regiões de produção. “Para isso, é preciso uma negociação com todos os clientes e a criação de Joint Ventures para que eles façam parte desses polos processadores. É uma solução mais complexa do que construir portos, mas ela tende a eliminar o estresse traumático criado a cada escoamento de safra”, explica o especialista.
Na semana passada, representantes da Câmara Temática de Infraestrutura e Logística do Agronegócio reuniram-se e estabeleceram uma agenda de trabalhos para acompanhar o escoamento da safra e o carregamento de estoques. No encontro, foi colocada a necessidade de maior agilidade na concessão dos portos, para que alavanque a capacidade de escoamento. Esta ampliação tem foco na metade Norte do Brasil, privilegiando os portos do Arco Norte-Nordeste, como Santarém (PA), Outeiro (PA), Vila do Conde (PA), Santana (AP), Itaqui (MA) e São Luiz (MA). A medida tem a ideia de reduzir em 700 quilômetros o trajeto dos grãos e diminuir em 35% o custo logístico do produtor. O Jornal do Comércio tentou contatos com representantes dos órgãos federais que lidam com o tema, mas não obteve retorno.
Rio Grande surge como opção a Santos e Paranaguá
Estudo recente divulgado pela assessoria econômica da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul) mostrou que, no ano passado, o Porto do Rio Grande foi responsável por 8,2 milhões de toneladas embarcadas de soja, 19% do total de 42,7 milhões exportadas no período, superando o porto de Paranaguá e ficando apenas atrás de Santos. O crescimento registrado entre 2008 e 2013 foi de 145%, enquanto Paranaguá teve aumento de 58%, e Santos, de 80%.
O economista chefe da entidade, Antônio da Luz, explica que um dos motivos dessa alta está na opção das tradings em trazer o grão para o Rio Grande do Sul e evitar a perda de tempo causada pela demora nos portos paulista e paranaense. “Muitas rotas de algumas empresas logísticas, quando percebem que a situação está ruim nesses portos, elas vêm para Rio Grande. Essas empresas estão preferindo pagar o frete a mais do que o custo pela espera”, analisa.
Apesar da oportunidade de crescimento das exportações, da Luz alerta que, se não houver investimentos, o movimento pode também esgotar Rio Grande. O economista avalia que o Rio Grande do Sul tem estrutura para receber soja até da Argentina e do Paraguai se aproveitar melhor o transporte fluvial. O custo desse modal é um terço mais barato que o rodoviário. “É muito mais barato enviar soja do Mato Grosso do Sul para cá do que para Santos ou Paranaguá, desde que por um sistema eficiente. Essa soja destinada para a China vai pelo Cabo da Boa Esperança, na África, e temos uma localização mais privilegiada que os outros portos”, salienta. Da Luz reforça que o produtor gaúcho deixa de arrecadar R$ 6,80 por saca de 60 quilos de soja com a perda de competitividade logística.
FONTE: Jornal do Comércio