O Brasil vive um período de baixíssimos índices de desemprego. Segundo dados do IBGE o índice de desemprego nas regiões metropolitanas vem despencando na última década. Era de 12,4% da população economicamente ativa em 2003 e caiu para apenas 5,4% em 2013 (gráfico). Isso equivale praticamente a uma situação de pleno emprego.
Escassez de motoristas
A baixa taxa de desocupação tem gerado escassez de mão-de-obra qualificada em todos os setores da economia, inclusive no Transporte Rodoviário de Cargas (TRC), que é um grande empregador. No ano passado, o TRC empregou 2,6 milhões de trabalhadores. Isso equivale a 20,5% da força de trabalho empregada no setor de serviços privados não financeiros.
Pesquisa realizada pela CNT – Confederação Nacional dos Transportes revela que, no setor rodoviário, 71,5% das empresas citam a escassez de mão de obra como principal problema do setor. Outros 19,4% destacam a falta de experiência dos candidatos. Segundo 17,9% o alto custo da mão de obra constitui barreira à contratação; 13,9% dizem que faltam cursos de treinamento; enquanto 16,7% reclamam dos elevados encargos sociais.
Em pesquisa realizada no final de 2013, a NTC perguntou aos transportadores o que pode limitar o crescimento da empresa em 2014. Nada menos que 29,5% apontaram como principal problema a falta de mão de obra, em especial de motoristas e ajudantes (tabela 1).
Note-se que a falta de motoristas e ajudantes aparece à frente até do grave problema das deficiências de infraestrutura. A maioria dos filhos de motoristas não querem abraçar a profissão do pai.
Faltam 106 mil profissionais
Pesquisa realizada pela NTC em abril deste ano com 143 empresas de transportes revela que o ganho médio de um motorista urbano, incluindo vale refeição, plano de saúde e seguro de vida chega a R$ 2.213,79. Para o condutor rodoviário este valor sobe para R$ 3.010,71.
O principal obstáculo apontado para a dificuldade de se contratar motoristas foi a severidade e as dificuldades da profissão. Esta severidade pode ser traduzida pelas longas jornadas de trabalho, quase sempre longe da família, as estradas ruins e o medo de acidentes e assaltos.
Constatou-se também que o déficit médio de motoristas chega a 12,1% da frota das empresas. Como existem hoje, segundo a ANTT, 675.086 veículos automotores nas mãos das empresas e admitindo-se que cada caminhão tenha um único motorista, chega-se a um déficit total de cerca de 82 motoristas (tabela 2).
Admitindo-se 1,3 motoristas por veículo o déficit sobe para cerca de 106.000 condutoresNo entanto, a tendência hoje é de se utilizar mais de um motorista por veículo, não apenas para atender à legislação (lei 12.619/2012), como também para otimizar a produtividade do veículo.
Lei agravou escassez
A Lei no 12.619/2012 agravou a escassez dos motoristas, pois limitou a jornada de trabalho dos motoristas empregados para 10 horas diárias.
Antes da Lei, vigorava o inciso I do artigo 62, da CLT, que dispensa o trabalho externo do controle de jornada. Um motorista com jornada de 24 dias por mês, poderia trabalhar, por exemplo, 360 horas (15 horas por dia).
Depois da lei, esta jornada fica limitada a 240 horas. Resultado: Redução de 33,3% no número de viagens e aumento dos custos fixos por viagem.
Com isso, os custos operacionais das empresas subiram substancialmente, especialmente nas distâncias curtas, nas quais o peso do salário (que compõe o custo fixo) é maior (tabela 3).
Buscando amenizar o problema, a CNT está lançando o projeto Primeira Habilitação para o Transporte, que vai financiar a formação como motoristas de 50 mil jovens de baixa renda entre 18 e 25 anos.
Tentativas de solução
O projeto, que será realizado pelo Sest Senat, prevê o custeio de todos os procedimentos necessários para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) categoria B. Para a seleção dos jovens, o Sest Senat utilizará as suas unidades de atendimento, os sindicatos e as empresas de transporte rodoviário de cargas e de passageiros.
Está prevista também a continuidade da formação desses jovens para atuarem como motoristas profissionais. Para isso, o Sest Senat oferecerá cursos de formação específica tanto para motoristas de ônibus como de caminhão, além de viabilizar a mudança de categoria da CNH (D ou E) dos participantes. O treinamento utilizará simuladores de direção de última geração e estará integrado ao Programa Trainee de Novos Motoristas e ao Programa de Formação de Novos Motoristas.
Colômbia
Muitos dutos de petróleo foram instalados na Colômbia e o produto deixou de ser transportado por caminhões, deixando a mão de obra disponível. Um instrutor colombiano veio ao Brasil fazer um curso de reciclagem de motoristas, percebeu a oportunidade e, ao retornar, divulgou para os colegas.
O Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas no Estado do Paraná (Setcepar) passou então a recrutar motoristas da Colômbia e faz a troca da carteira e processo burocrático para legalizar a situação dos motoristas no país. Os trabalhadores também passam por um treinamento no sindicato, com orientações, por exemplo, sobre direção defensiva, legislação e primeiros socorros, além de aulas práticas com um caminhão, na região de Curitiba.
Impactos salariais
Nos últimos anos, os salários dos motoristas estão subindo acima da inflação. Em São Paulo, em maio de 2013, os aumentos foram de 10%, contra uma inflação na faixa de 6%. Em maio de 2014, o aumento, de 7,5%, foi também superior à inflação.
Nos últimos nove anos, os salários paulistanos tiveram reajuste real acumulado de 20,16%, ou seja, aumento salarial acumulado de 106,91%, contra uma inflação oficial acumulada de 72,2%.
Para reter ou conquistar motoristas as empresas precisarão oferecer cada vez mais melhores salários e benefícios.
Uma simples simulação mostra que o impacto desta tendência sobre os custos será grande e que as empresas precisam estar preparadas para enfrentá-la.
Admita-se que os salários reais dos motoristas subam 30% no longo prazo que os demais custos reais permaneçam constantes. Toma-se como base uma combinação de um cavalo mecânico de dois eixos tracionando carreta de 3 eixos, com custo fixo mensal de R$ 14.900,00 e custo variável por quilômetro de R$ 1,53. Como os encargos dobram o custo salarial, admita-se um salário médio de R$ 6.000,00.
Obtêm-se, portanto, os dados da tabela 4:
Os dados da tabela 5 refletem os custos mensais atuais, para 2.000 km (distâncias muito curtas), 6.000 km (distâncias médias) e 10.000 km (distâncias longas) mensais.
Os dados da tabela 6 mostram os custos futuros para 2.000 km (distâncias muito curtas), 6.000 km (distâncias médias) e 10.000 km (distâncias longas) mensais
Constata-se que o aumento de custos resultante da elevação dos salários dos motoristas é maior nas curtas distâncias (10,0%), reduzindo-se bastante na longa distância (5,4%). De qualquer maneira, as elevações de custos serão bastante significativas no futuro.A tabela 7 reflete os aumentos de custos:
O autor é mestre em Engenharia de Transportes, diretor-técnico administrativo da NTC, membro da Câmara de Assuntos Veiculares do CONTRAN e presidente da 24ª. JARI do DER-SP.
FONTE: Na Boléia