Na semana passada, o caminhoneiro londrinense Rogério Silva (nome fictício) recebeu a visita surpresa de um oficial de Justiça. Aos 38 anos, o motorista viu seu Iveco Stralis, modelo 480, ano 2013, ser levado embora pelo representante do Judiciário. Durante os primeiros dez meses de financiamento do veículo, Silva conseguiu honrar seu compromisso com o banco. No total, pagou cerca de R$ 80 mil. Mas, no início do ano passado, ele começou a sentir dificuldade de pagar as prestações, até que parou de vez.
Embora não haja estatísticas disponíveis a respeito da inadimplência no financiamento de caminhões, os transportadores rodoviários de carga dizem que situações como as de Silva são cada dia mais comum. “A crise está feia demais”, diz o caminhoneiro. Até 2013, ele conta que o frete de grãos entre a região de Cascavel (Oeste) e o Porto de Paranaguá chegou a R$ 90 a tonelada. E agora não passa de R$ 60. Sendo que, desde então, todos os insumos do setor sofreram reajustes.
O transporte rodoviário de carga vive uma situação especialmente difícil no País. Nos últimos anos, para atender ao lobby das montadoras, o governo federal, por meio do Banco do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), ofereceu juros baixíssimos para a compra de caminhões. No ano passado, por exemplo, a taxa ficou abaixo da inflação, a 6% ao ano.
Com o desaquecimento econômico e menos carga para ser transportada, passou a sobrar caminhão no mercado e, consequentemente, a cair o valor do frete. O sonho do caminhoneiro londrinense de tornar-se um empresário de transporte foi interrompido. Agora, ele só tem seu Mercedes-Benz, ano 1997, para trabalhar. “Tudo subiu, o diesel, o pedágio, os pneus. E o frete caiu. Não tem como ficar em pé”, alega.
A empresa dele, a Compager, está conseguindo sobreviver graças à diversificação dos negócios. “Além do transporte, faço armazenagem e operação portuária. Se fosse depender só de caminhão, não estaria aguentando”, afirma o empresário que tem 70 veículos na frota.
Outro empresário, o presidente do Grupo G10 de Maringá, Cláudio Adamuccio, diz que o transportador está gastando mais que ganha para trabalhar. Principalmente quando atua no segmento graneleiro. “Esta é uma área com quatro grandes embarcadores no País (ADM, Bunge, Cargil e Dreyfus), que, por outro lado, têm à disposição dezenas de milhares de transportadores para contratar. Nesta queda de braço do mercado, somos a parte mais fraca”, analisa.
Adamuccio afirma que a inadimplência no financiamento de caminhões aumentou três vezes nos últimos seis meses. A reportagem não conseguiu confirmar a informação nos bancos.
Empresas têm dificuldade de repassar reajuste do diesel
Desde o dia 1º de fevereiro, o preço do óleo diesel está mais caro. O governo liberou um reajuste de R$ 0,15 por litro na refinaria, devido ao aumento da alíquota de PIS/Cofins. Este é mais um fator a dificultar a vida do transportador rodoviário de carga. Segundo Rodolfo Ribeiro, coordenador de abastecimento da Transpanorama, de Maringá, o aumento será maior na bomba, podendo chegar a R$ 0,25 por litro.
Na quinta-feira, ele conversou com a reportagem e deu um exemplo que mostra a evolução do preço do combustível. “Um caminhão da empresa pagou R$ 2,58 o litro do combustível num posto do interior de São Paulo. Na semana anterior, tinha pagado R$ 2,41 no mesmo estabelecimento”, conta. Segundo Ribeiro, em janeiro de 2013, o valor era R$ 2,31, ou seja, o aumento foi de 11,6% em pouco mais de 12 meses. Somente o último reajuste representará um impacto de R$ 500 mil ao ano na planilha da transportadora.
“Vai ser muito difícil de repassar esse aumento ao cliente”, admite Gilberto Cantú, presidente do Sindicato das Empesas de Transporte do Paraná (Setcepar). “A economia está em baixa, a concorrência está acirrada e o transportador está com a corda no pescoço”, declara. Ele explica que, nos fretes de produtos de alto valor agregado, as transportadoras trabalham com contratos de longo prazo, que preveem repasse de reajuste no diesel. “Mas, no transporte de grãos, por exemplo, a tarifa do frete flutua de acordo com as regras de mercado.” Ele acredita que 2015 será um ano ainda mais difícil para o setor. “O primeiro semestre será um semestre perdido”, conta.
Neuto Gonçalves dos Reis, diretor técnico da associação que representa as grandes transportadoras do País, a NTC&Logística, diz que as empresas precisam repassar os aumentos de custo, sob pena de quebrarem. Ele ressalta que não se trata apenas do óleo diesel. “Tem o impacto da Lei 12.619″, afirma. Apelidada de Lei do Descanso, ela determina limites para o tempo de trabalho dos caminhoneiros, o que eleva os custos das transportadoras. Sancionada há dois anos e meio, a lei vem sendo assimilada aos poucos pelo mercado.
“Tem também o Euro 5 e o Arla 32″, ressalta o diretor em referência à legislação ambiental Euro 5, que aumentou o custo dos caminhões. O Arla 32 é um aditivo que se tornou obrigatório com a nova motorização ecológica. “Tem o aumento da energia elétrica e dos impostos. Enfim, o transportador precisa fazer os cálculos e repassar esses valores”, afirma.
Gonçalves, no entanto, reconhece a dificuldade de fazer o repasse, principalmente no segmento de transporte graneleiro. “Tem muita gente inadimplente em Mato Grosso, tendo que entregar seus caminhões novos”, declara. Segundo, ele, a situação é grave a ponto de a NTC&Logística ter negociado um refinanciamento para os empresários no BNDES. “Conseguimos mais 60 meses, mas os bancos (para quem a instituição estatal repassa os recursos) não estão aceitando essa operação”, alega.
O diretor conta que no final deste mês será realizado um congresso nacional da entidade, quando vai ser divulgado o novo índice de referência para reajuste do frete. Ele diz que não se deve esperar nada menos que 15%.
FONTE: Carga Pesada