Facchini

“Está sobrando caminhão”, aponta Carcon

O tombo do mercado de caminhões no início deste ano pode ter sido causado por mais do que simplesmente o esfriamento do ritmo econômico do Brasil. A dor de cabeça de cabeça dos fabricantes do segmento deve se prolongar, já que a contração da demanda pode ser consequência inesperada do constante incentivo às vendas oferecido pelo governo nos últimos anos por meio do PSI (Programa de Sustentação do Investimento), que garante melhores condições de financiamento. “Está sobrando caminhão no mercado”, resume Carlos Reis, sócio sênior da Carcon Automotive. 
O especialista avalia que, entre 2009 - quando estímulo às vendas de caminhões começou a ser oferecido - e 2014 as vendas do setor tiveram crescimento médio de 5% ao ano. No mesmo período, a demanda por frete avançou, em média, 3,2% por ano. “O PSI jogou muito caminhão na praça e agora não sabemos qual é o tamanho real da demanda real”, aponta. 
Reis lembra que a média anual de vendas do mercado interno nos sete anos que antecederam a crise financeira de 2008 foi de 84 mil caminhões. Nos sete anos seguintes, com a criação do PSI, este número subiu para 140 mil caminhões/ano. Este impulso oferecido pelo governo fez a frota brasileira mais do que dobrar em pouco mais de uma década, saindo de 1,5 milhão de unidades em 2002 para 3,2 milhões de caminhões em 2014. 
O consultor acredita que agora os fabricantes sentem o efeito da saturação do incentivo combinada ao ritmo lento de renovação da frota. Apenas 1,1 mil caminhões são excluídos do registro do Renavam anualmente. Ainda que outra parcela de veículos seja sucateada e saia de circulação sem ser retirada do registro, o número é muito baixo na comparação com o acelerado ritmo de emplacamentos. “O erro foi incentivar as vendas sem criar um plano de renovação da frota”, explica o consultor. 
Se o entrave à demanda por caminhões for mesmo este, a trajetória de queda será mais difícil de ser revertida e as montadoras precisarão administrar alta ociosidade da capacidade produtiva. A Carcon estima que a indústria local tenha potencial para fabricar 280 mil veículos por ano. “As empresas investiram muito recentemente”, lembra Reis. Segundo ele, atualmente apenas 48% desta capacidade está em utilização. 
Para contornar este cenário, o estabelecimento de um programa de renovação de frota ganha mais urgência. O assunto é tema de debate entre Anfavea e governo federal desde 2013. Em dezembro do ano passado Luiz Moan, presidente da entidade, chegou a afirmar que a política para tirar veículos antigos de circulação estava em fase de ajustes finais e deveria começar a ser implementada no início de 2015 (leia aqui). Na quarta-feira, 25, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), Armando Monteiro, garantiu que a pasta está empenhada na aprovação de um programa do gênero (leia aqui). 
QUEDA DE 30% EM 2015 
“Acredito que a demanda real hoje deve estar em torno de 110 mil unidades por ano”, estima Reis, traçando projeção sobre como mercado teria se desenvolvido sem o efeito do PSI nos últimos anos. Dentro deste cenário, as vendas de caminhões devem ficar em torno de 94 mil unidades em 2015, com queda de 30% na comparação com o ano passado. O resultado evidencia, além do esgotamento do incentivo governamental, a incerteza acerca do cenário econômico, com a confiança do consumidor em baixa. 
Para traçar diagnóstico mais seguro, a Carcon Automotive trabalha em uma pesquisa com os frotistas e empresas de transportes. Até agora a consultoria obteve as respostas de mais de 120 profissionais responsáveis pelas compras de caminhões nestas companhias. A consultoria antecipou resultado prévio do levantamento a Automotive Business. O estudo indica que os entrevistados esperam queda em torno de 15% na demanda por frete este ano, com retração no transporte de grãos e na área de logística e distribuição. Na construção civil a contração pode ser ainda mais severa.
Os participantes da pesquisa também apontaram os motivos para postergar ou cancelar a compra de veículos em 2015. Para 44% dos entrevistados a situação econômica do Brasil é o fator principal. Outros 23% acreditam que a baixa demanda é a razão fundamental para desistir de comprar este ano. A Carcon alerta que apenas 14% dos entrevistados alegam que o cancelamento da aquisição de novos veículos é causado pela falta de financiamento. O resultado confirma a análise da consultoria de que as condições de financiamento pelo PSI já não são mais solução para estimular as vendas.
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