O RNTRC (Registro Nacional dos Transportadores Rodoviários de Cargas) foi instituído pelo art. 14-A da Lei nº 10.233, de 5/6/2001, que dispõe, de forma taxativa: “O exercício da atividade de transporte rodoviário de cargas, por conta de terceiros e mediante remuneração, depende de inscrição do transportador no Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Carga – RNTRC” (o grifo é nosso).
Alguns anos mais tarde, foi aprovada a Lei nº 11.442, de 5/1/2007, cujo art. 2º reafirma a inscrição no RNTRC como condição indispensável ao exercício da atividade econômica do TRC e atribui à ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) a responsabilidade de implantá-lo e administrá-lo.
Portanto, quando a ANTT cuida de implantar o RNTRC, ela está apenas dando cumprimento a um comando legal. Se não o fizesse, seus dirigentes estariam sujeitos a responder por prevaricação, na modalidade omissiva, tal como definido pelo art. 319 do Código Penal. E os transportadores ficariam impedidos de ter acesso a uma formalidade essencial ao exercício da sua atividade – a inscrição no RNTRC.
Uma proposta do setor
Há outro aspecto que aumenta muito a nossa responsabilidade de defender o RNTRC. É que proposta que deu origem aos dispositivos legais acima referidos partiu das nossas próprias entidades de classe, sob a coordenação da NTC&Logística, após muitos anos de debates nos plenários nacionais do setor, sempre associada à luta histórica da regulamentação.
Como regulamentar o que não se conhece? Por isso, nas propostas mais antigas, o RNTRC era tratado como um processo meramente censitário, para, num segundo momento, evoluir para condição indispensável ao exercício da atividade – como acabou sendo consagrado na lei – e, mais à frente, para servir de instrumento às sempre lembradas “barreiras de entrada”.
De toda forma, o RNTRC é, sem dúvida, elemento estratégico para a organização do setor, já que, sem ele, não haveria sequer como começar qualquer processo com este objetivo.
Por que recadastrar?
O recadastramento é necessário porque o registro anterior, regido pela Resolução ANTT nº 3.056, de 12/03/09, tinha validade por 5 anos, prazo já largamente ultrapassado, tanto que foi prorrogado duas vezes (através das Resoluções 4.330 e 4.490, de maio e novembro de 2014), enquanto se estudava o processo de recadastramento, que foi finalmente regulamentado pela Resolução ANTT nº 4.799, de 27/7/15.
Fruto do aprendizado propiciado pelo cadastramento anterior, a ANTT houve por bem introduzir inúmeros aperfeiçoamentos nos procedimentos de inscrição no RNTRC, nesta sua nova fase, que teve início efetivo ontem, 1º de dezembro, devendo se estender por todo o ano de 2016.
É de se observar que o registro resultante do recadastramento também terá validade por 5 anos, porque é inevitável que haja um prazo, tendo em vista o dinamismo que caracteriza o mercado do TRC e a velocidade com que as tecnologias aplicadas ao processo se tornam obsoletas.
Inovações importantes
Entre as inovações, destacam-se a instalação obrigatória de dispositivo de identificação eletrônica (tag) nos veículos automotores e a aplicação de etiquetas autocolantes (com padrão tecnológico muito superior às utilizadas no registro anterior) nos veículos automotores e também nos reboques e semirreboques, de modo a possibilitar o monitoramento permanente e a fiscalização eletrônica das operações do TRC, num nível jamais experimentado em nosso país.
Esses recursos, somados ao conhecimento e ao manifesto eletrônicos (CT-e e MDF-e), devem propiciar, nos próximos 2 ou 3 anos, uma forte redução da informalidade que sempre caracterizou o TRC, viabilizando a fiscalização do cumprimento de várias leis que têm sido ignoradas por parcelas significativas do mercado (ex.: seguro obrigatório, vale-pedágio, pagamento eletrônico de frete, controle de peso e de jornada de trabalho, indenização por excesso de retenção de veículo para carga e descarga etc.), oferecendo segurança jurídica aos que querem trabalhar direito e praticamente eliminando do mercado os que somente sobrevivem à base do descumprimento da lei, da sonegação e da concorrência desleal.
Participação das nossas entidades
Entre as mudanças importantes introduzidas pela ANTT neste recadastramento, uma em especial revela o quanto o TRC e suas entidades cresceram no relacionamento com o poder público, por força de uma atuação séria e coerente ao longo dos anos.
É que, desta vez, apenas as entidades sindicais – federações e sindicatos a elas filiados – de empresas de transporte e de transportadores autônomos, estão credenciadas a agir como representantes da Agência, mediante convênio celebrado na forma da lei, de modo que cada empresa ou autônomo deverá procurar o seu próprio sindicato, na região da sua matriz ou do seu domicílio, para as providências de recadastramento.
Com isso, a ANTT – que conta apenas com sua sede em Brasília e 8 escritórios regionais – poderá se beneficiar da capilaridade de centenas de entidades sindicais que cobrem todo o país, sem o que o recadastramento seria impraticável. E estas, além da oportunidade de prestar um serviço relevante a seus representados, terão acesso, em primeira mão, às informações básicas e essenciais para bem cumprir a sua missão representativa, identificando quem são e onde estão os componentes da categoria em sua base territorial.
Chegou-se, sem dúvida, a uma solução justa, que atende aos interesses legítimos de todos os envolvidos e que, além disso, afasta do processo pessoas e organizações despreparadas – e, em alguns casos, mal intencionadas - que, no cadastramento anterior, cometeram inúmeros deslizes, permitindo a inscrição de operadores em desacordo com a lei e propiciando outras irregularidades que, agora, não deverão se repetir. Mas, se acontecerem, serão facilmente identificadas e sanadas.
Quanto vai custar?
Os valores devidos pelas empresas de transporte para atualização do seu RNTRC já estão definidos: R$ 131,00 para os veículos automotores e R$ 106,00 para os implementos (que terão ainda um desconto de R$ 15,00, em ambos os casos, quando o interessado for sócio da entidade que faz o registro).
Mesmo com a inclusão das tags, que só começarão a ser instaladas a partir de março/abril do próximo ano, cujo valor está estimado em cerca de R$ 50,00 – e que somente serão colocados nos veículos automotores – o preço final, para as empresas associadas das nossas entidades, não deverá ultrapassar R$ 166,00, por veículo automotor e R$ 91,00, por implemento rodoviário.
Para propiciar aos grandes frotistas um fluxo de caixa mais confortável, os veículos e implementos poderão ser incorporados ao RNTRC pelo final de placa, o que possibilitará distribuir esse custo ao longo de todo o próximo ano.
Despesa ou investimento?
Além disso, não se pode esquecer que este é um valor a ser pago para garantir o direito ao exercício da atividade durante 5 anos. Portanto, estamos falando, na pior hipótese, de um custo aproximado de R$ 33,20 por veículo automotor/ano, o que, convenhamos, parece bastante razoável, sobretudo quando se tem em conta os resultados do projeto piloto desenvolvido no Rio Grande do Sul.
Lá, os sistemas eletrônicos que o recadastramento tornará obrigatórios em todo o país possibilitaram aos caminhões das empresas participantes do teste passarem pelos postos fiscais sem qualquer retenção. Não por acaso, empresários que acompanharam de perto esta experiência são os mais entusiasmados defensores do novo RNTRC, na certeza de que o recadastramento, nos moldes definidos pela ANTT, não representa uma despesa mas um investimento, cujo retorno, em termos de ganho de produtividade, não se calcula em anos, nem em meses, mas em alguns poucos dias.
Ressarcimento de despesas das entidades
Como já foi divulgado, as federações e sindicatos do setor terão uma participação na receita do recadastramento, a título de ressarcimento dos custos que terão de suportar com a prestação de serviços complexos, que envolvem compra de material (etiquetas autocolantes e tags), controle rigoroso de estoque, pois se trata de material que não pode sofrer extravio, além de computadores, softwares, material de escritório e, principalmente, pessoal treinado, prestação de contas à ANTT, atendimento de representantes das empresas, esclarecimento de dúvidas etc.
Ora, as nossas entidades sobrevivem com recursos escassos e convivem com uma situação insolúvel, qual seja, a de trabalharem para o conjunto do setor, constituído por um número relativamente pequeno de empresas associadas e uma grande maioria de não- associados, que, quando muito, pagam, uma vez por ano, a contribuição sindical compulsória. Grande parte do custeio das entidades sindicais é garantida pela contribuição voluntária dos associados. Mas os benefícios da atuação delas acabam se estendendo, indistintamente, a sócios e não-sócios, o que não é, em essência, uma situação justa.
Um exemplo bem recente foi o da desoneração da folha de pagamento. As nossas entidades, mantidas pelos abnegados de sempre, sob a coordenação da NTC e da Seção de Cargas da CNT, desenvolveram um trabalho notável. Primeiro, conseguindo incluir o TRC no grupo de setores que se beneficiariam da medida, com a alíquota de 1%. Depois, quando o Governo quis rever a desoneração e o setor foi enquadrado na faixa de 2,5%, outra grande mobilização conseguiu incluir o TRC na faixa intermediária de 1,5%, através de emenda parlamentar, acolhida sem veto pela presidente da República. Somente 3 ou 4 setores, entre os mais de 50 incluídos no processo de desoneração, conseguiram isso. Um trabalho extraordinário que, como sempre, acabou beneficiando a todas as empresas do TRC, a maior parte delas não associadas.
No caso presente do recadastramento no RNTRC, esta situação se tornaria ainda mais injusta, porque a universalização do atendimento, sem distinção entre associados ou não, é da natureza da delegação recebida da ANTT. Como os custos decorrentes desse trabalho não cabem no orçamento ordinário das entidades, não há outra solução: ou se cobra de todas as empresas (dando um benefício razoável aos associados, como foi feito), ou se sacrifica mais ainda os sócios, aumentando o valor das contribuições deles, em benefício dos que optam por não participar da manutenção da sua entidade.
Tags e antenas
A defasagem determinada pela ANTT entre o registro e a implantação das tags deve-se a entendimentos em curso entre aquela Agência e o Denatran, que já definiu que o “tagueamento” dos caminhões funcionará também como uma primeira etapa do projeto SINIAV (que implicará na colocação obrigatória desses chips em todos os veículos automotores, de passeio e comerciais). Mas isso precisa ser formalizado numa resolução do Contran, que ainda não foi aprovada.
É do interesse do setor que a mesma tag atenda tanto ao RNTRC quanto ao SINIAV. Por isso mesmo, aliás, ambos os sistemas foram projetados para operar na mesma freqüência. Não podemos correr o risco de as empresas de transporte serem obrigadas a colocar duas tags em seus veículos. Este é também o entendimento da ANTT. Então, a solução foi atrasar um pouco a colocação desses dispositivos de identificação eletrônica, aguardando as exigências que o Contran deverá formular quanto ao conteúdo dos mesmos.
Discute-se a utilidade de ter toda a frota “tagueada” quando não há, ainda, antenas para efetuar a leitura e, portanto, para realizar o monitoramento e a fiscalização das operações, como é o objetivo declarado dessa solução. Mas a verdade é que, além das poucas antenas já implantadas pela Agência e pelos órgãos fazendários, há uma grande quantidade delas já em funcionamento em toda a malha de rodovias concedidas, para efetuar a cobrança automática de pedágio. Essas antenas podem perfeitamente se prestar à leitura das tags instaladas nos caminhões. E a ANTT sempre poderá determinar às concessionárias que instalem tantas outras quantas sejam necessárias.
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Por tudo quanto dito acima, fica claro que a realidade que cerca o recadastramento dos transportadores no RNTRC é muito mais complexa e abrangente do que parece à primeira vista.
Em caso de dúvida sobre os aspectos do RNTRC aqui comentados, ou sobre quaisquer outros, procure se informar melhor junto ao Sindicato patronal da sua região, ou mesmo junto à NTC&Logística.
O objetivo de dotar o mercado do TRC de regras claras e justas, de modo a oferecer um mínimo de segurança jurídica a seus operadores – que vem sendo perseguido há décadas pelas entidades do setor –, nunca esteve tão perto de ser alcançado. Não podemos perder esta oportunidade.