Em janeiro de 2012, a adoção do padrão Euro 5/Proconve 7 no Brasil foi recebida com festa pelos ecologistas. Afinal, os novos parâmetros de emissões representavam uma redução expressiva nos poluentes despejados pelos motores diesel na atmosfera brasileira. Uma das tecnologias antipoluição apresentadas na época, a SCR – Catalisador de Redução Seletiva –, introduziu um novo insumo na planilha dos caminhoneiros nacionais: o Arla 32. Nos veículos com essa tecnologia, a adição dessa solução de ureia a 32,5% em água desmineralizada provoca uma reação química dentro do catalisador e reduz expressivamente os óxidos de nitrogênio (NOx) dos gases expelidos pelos motores diesel com SCR. Na teoria, resolvido. Na prática, nem tanto. Segundo a Afeevas – Associação dos Fabricantes de Equipamentos para Controle de Emissões Veiculares da América do Sul –, o consumo atual de Arla 32 no Brasil está mais de 30% abaixo do que deveria existir em relação à frota circulante de caminhões com tecnologia SCR. “Tal defasagem permite concluir que cerca de um terço os motoristas brasileiros de caminhões Euro 5 com tecnologia SCR adotam ‘soluções alternativas’ para economizar no consumo de Arla 32”, contabiliza o engenheiro mecânico Elcio Luiz Farah, consultor para questões de tecnologia e meio ambiente e diretor adjunto da Afeevas.
No Brasil, o Arla 32 tem custo por litro similar ao do diesel e, quando corretamente utilizado, é consumido em uma proporção de 5% em relação ao combustível gasto. Ou seja, em uma viagem de demande 100 litros de diesel serão utilizados 5 litros de Arla 32. Mas, ao contrário do que possa parecer, a adoção dessa “medida de economia” pode ter pouco a ver com racionalidade. “Burlar o sistema de injeção de Arla 32, além de aumentar a emissão de óxidos de nitrogênio, pode causar danos permanentes no sistema que injeta o produto, uma vez que a refrigeração é realizada pela substância”, explica Darwin Viegas, diretor de Engenharia de Desenvolvimento do Produto da Iveco. “O catalisador passa a trabalhar com altas temperaturas que acabam destruindo-o. E custo de um catalisador novo é proibitivo. Pode chegar a mais de R$ 20 mil”, complementa o engenheiro mecânico Francisco Satkunas, conselheiro da SAE Brasil – Sociedade dos Engenheiros da Mobilidade.
Apesar de ilegais, os emuladores que fazem os motores diesel com SCR dispensarem o uso do Arla 32 podem ser facilmente adquiridos através da internet . O custo desses equipamentos – também conhecidos como “chips paraguaios” – varia entre R$ 300 e R$ 2 mil. Seu funcionamento é relativamente simples. Os dispositivos eletrônicos enganam o sistema OBD (On-Board Diagnostics), que monitora a presença e a utilização do aditivo, bem como a emissão de NOx “Esses dispositivos substituem os sinais dos sensores por outros falsos que, enviados ao OBD, fazem com que pareça que o Arla 32 está sendo utilizado, quando na verdade isso não está ocorrendo”, detalha Farah, da Afeevas. O aumento nas emissões de óxidos de nitrogênio pode chegar a mais de 400% – níveis equivalentes aos dos veículos diesel comercializados no país na década de 1990. Outra contra-indicação é que, para que as altas emissões não perdurem e o veículo não seja danificado, o gerenciamento eletrônico do motor normalmente faz com que o torque seja diminuído depois de algum tempo, até que o “problema” seja reparado.
Outro método adotado para evitar o consumo do Arla 32 em motores diesel com SCR é a utilização de misturas falsificadas, com água de torneira – não ionizada – e amônia agrícola “Isso engana o sistema, mas a água e a amônia altamente contaminada acabam por destruir o catalisador. E a Policia Rodoviária já esta se equipando com detector de uso do Arla 32 e rapidamente pode concluir se há adulteração ou não”, pondera Satkunas, da SAE Brasil
Ao contrário do que muitos podem acreditar, a ideia de burlar o uso do Arla 32 não é invenção brasileira. “O uso de mecanismos para burlar o sistema SCR foi desenvolvido na Europa a partir de 2005, para permitir que veículos projetados para baixa emissão de poluentes e que necessitavam de Arla 32 pudessem trafegar por países que ainda não dispunham desses produtos, principalmente no Leste Europeu”, ensina Farah, da Afeevas.
Além do prejuízo ao ecossistema, fraudar a utilização correta do Arla 32 também pode acarretar em problemas legais. “É uma infração prevista no Código Nacional de Trânsito com multa e perda de pontos na Carteira de Habilitação, além de ser um crime ambiental também punido com multa e até a prisão dos responsáveis pela adulteração e condução do veículo”, alerta Farah, da Afeevas. “Além disso, a instalação de componentes estranhos ao sistema eletrônico pode comprometer o funcionamento do caminhão, que perde a garantia de fábrica”, avisa Viegas, da Iveco. Os caminhões com motores que utilizam o sistema de purificação dos gases EGR – Exhaust Gas Recirculation ou recirculação dos gases de escapamento – são uma alternativa para os caminhoneiros que querem evitar a utilização do Arla 32 sem cair na ilegalidade. “Os motores acima dos 400 cv que dispensam o uso do Arla começam a ter a preferência de alguns caminhoneiros”, indica Satkunas, da SAE Brasil.
FONTE: Salão do Carro