O Brasil tem uma frota de aproximadamente 440 mil veículos de transporte de cargas e de passageiros com mais de 30 anos, ainda em circulação. Desse total, cerca de 230 mil são caminhões. O restante corresponde a comerciais leves e ônibus. São modelos que, por terem a tecnologia ultrapassada, poluem mais e aumentam o risco de acidentes nas estradas. Os dados, levantados pela CNT (Confederação Nacional do Transporte), integram o Plano CNT de Reestruturação Econômica.
Assim, a renovação da frota é considerada como uma das medidas essenciais para promover o ganho da sustentabilidade ambiental da atividade transportadora. Estimativa da Confederação Nacional do Transporte aponta que, assim, seria possível reduzir em 10% o consumo de combustíveis. Somado às novas tecnologias, isso é capaz de diminuir significativamente as emissões de poluentes que resultam da queima do diesel. É o que defende o professor do curso de Engenharia de Energia da UnB (Universidade de Brasília) e vice-diretor da UnB Gama, Augusto César de Mendonça Brasil. Leia a entrevista que ele concedeu à Agência CNT de Notícias.
O Brasil é altamente dependente do transporte rodoviário. Qual o caminho que se deve seguir para, tendo em vista essa realidade, alcançar uma redução do impacto ambiental causado pela atividade?
Eu acho que a única forma de um país como o Brasil ter uma redução imediata é, primeiro, com um programa de renovação de frota. Isso teria impacto considerável, ao longo dos anos, nas emissões de poluentes do ar. Depois, continuar com o programa de investimento em biocombustíveis, especialmente em razão do diesel, seria uma boa ação. Mas com cuidados com toda a cadeia. Essa seriam as medidas mais óbvias e imediatas. Depois, é necessário um programa de mais longo prazo, com planejamento e gestão das rotas, qualidade das estradas. Aí seria um programa mais abrangente, de governo e instituições não governamentais.
A má qualidade da infraestrutura rodoviária também impacta nas emissões de poluentes pelos veículos?
Sim, pois quando se tem estradas de má qualidade, você tem um ciclo de velocidade baixo: anda, para, anda, para. Além disso, as rotas são prolongadas: quando o motorista não pode ir por uma rodovia mais curta e vai por outra, com aumento das distâncias, para evitar as estradas de péssima qualidade, interfere diretamente no consumo de combustível.
[A Pesquisa CNT de Rodovias 2015 estima que caminhões que trafegam em pavimento inadequado consomem, em média, 5% mais combustível. Estima-se que seja gerado um prejuízo em torno de R$ 2,10 bilhões pelo consumo desnecessário de 749 milhões de litros de combustível].
Quando se fala em transporte individual, o Brasil registrou, nos últimos anos, crescimento expressivo da frota. Isso reflete na qualidade do ar, em particular nas grandes cidades. Novas tecnologias podem ajudar a mitigar esses efeitos danosos?
Por meio da introdução de novas tecnologias de propulsão, veículos híbridos e elétricos. Vamos ter isso ao longo dos próximos anos, das próximas décadas. Mas, quando falamos de veículos elétricos, não significa que estamos migrando para uma plataforma mais limpa. Por exemplo: temos uma matriz de eletricidade no Brasil que vem, em grande parte, das hidrelétricas. Elas têm lá seus problemas ambientais, mas é uma energia renovável. E temos as termoelétricas, da indústria da cana e de combustíveis fósseis, que têm uma emissão de poluentes considerável. Se começamos a expandir a propulsão para elétrica, vamos migrar, naturalmente, para outra matriz. Então, vamos ter que usar mais as termoelétricas, na situação atual do Brasil. Vamos ter energias mais limpas? Temos que ter cuidado ao afirmarmos isso. Na China, por exemplo, os carros elétricos estão cada vez mais presentes, não há emissões de poluentes nas estradas. Mas lá se usa muito carvão para geração de energia elétrica...
Tem como medir o que seria menos pior?
Vamos dizer assim: nós conseguimos controlar as emissões de poluentes na geração de energia mais que no uso do automóvel. Pelo menos nesse aspecto o controle da poluição do ar ficaria mais fácil.
E quanto ao transporte coletivo e à decisão de as pessoas optarem por essa alternativa de transporte?
No transporte urbano, precisamos de mais investimento, para que as pessoas migrem do modo individual para o coletivo. Do contrário, vamos continuar com cidades muito voltadas para os veículos particulares, com excesso de trânsito, poluição... Mas o cidadão também precisa saber que ele faz parte dessa migração para uma solução melhor, com uso menos intensificado de um veículo particular, com a otimização desse uso, fazer mais rotas a pé ou de bicicleta. Ou seja, no primeiro nível, é o próprio cidadão que precisa de alguma consciência. Isso, às vezes, vem do pior modo, quando se percebe que a situação está insustentável. Por outro lado, tem a postura de país, de maneira geral, com investimentos públicos em transporte, e deixar claro, para o cidadão, que aquilo é um bem do cidadão e que deve ser usado como tal.
FONTE: CNT