No entorno dos complexos do Chapadão e da Pedreira, na Zona Norte do Rio, o crime não vive só de roubar cargas, mas também de não roubá-las. Empresários que transportam com frequência produtos pela região passaram a sofrer com um novo método de banditismo: por telefone, as quadrilhas exigem dinheiro em troca de não atacar caminhões de uma frota específica — caso a investida ocorra por engano, a promessa é devolver a carga intacta. Só entre abril e março, foram pelo menos dez tentativas de extorsão similares no estado, de acordo com o Sindicato das Empresas do Transporte Rodoviário de Cargas e Logísticas no estado (Sindicarga).
— Ligam e mandam depositar sinal de R$ 20 mil, além de uma mensalidade de R$ 5 mil, que também pode ser paga com 480 cestas básicas. Nossa orientação é para os empresários não aceitarem. É uma afronta — afirma Venâncio Moura, diretor do Sindicarga e coronel reformado da PM.
Esse tipo de prática já é apurada pela polícia. Com base em investigação da 39ª DP (Pavuna), o promotor Marcelo Muniz, coordenador da 1ª Central de Inquéritos, denunciou, no último dia 18, quatro suspeitos que atuavam na Pavuna pelos crimes de formação de quadrilha, extorsão e roubo. Segundo a denúncia, um motorista e dois ajudantes indicavam a bandidos da Pedreira a rota dos veículos da empresa onde trabalhavam à época, em meados de 2016. A transportadora teria se tornado alvo das investidas justamente por negar pagar o “pedágio” imposto para não sofrer assaltos.
Um dos denunciados pelo Ministério Público do Rio (MP) é Breno Soares Lopes, o Peludinho. Ligado a um dos funcionários da empresa, ele era informado do trajeto dos caminhões. Apontado como segurança de Carlos José da Silva Fernandes, o Arafat — chefe do tráfico na Pedreira, atualmente preso — Breno também está no cárcere desde julho, após ação da Polícia Federal.
Negociação de produtos caiu no grampo
Escutas telefônicas, feitas com autorização da Justiça, flagraram um dos empregados da transportadora denunciados pelo MP conversando com um homem não identificado. No diálogo, de 25 de junho de 2016, o funcionário, que mantinha contato com os assaltantes de carga, oferece a venda de uma caixa de óleo de cozinha.
De acordo com a polícia, a mercadoria é, ao que tudo indica, fruto de algum dos roubos protagonizados pelo bando. “Chegou óleo de cozinha a R$ 2,50, te interessa?”, diz o suspeito na ligação. O outro homem pergunta quantas unidades há na caixa e recebe a seguinte resposta. “Vinte. ‘Tá’ saindo a 50 (reais, a caixa). No mercado, cada um ‘tá’ três e porrada, quatro ou cinco, depende do óleo”, conclui.
Óleo de cozinha também foi um dos itens comprados pelo EXTRA nos trens da SuperVia, no Ramal Belford Roxo, que se transformou em um feirão de produtos roubados — neste caso, o crime ocorreu dois dias antes da oferta nos vagões. A negociação aconteceu no dia 13 de março, quando quatro litros do produto custaram R$ 10.
FONTE: Extra